“Devemos fazer algo agora para conter a violência interna”, diz ativista árabe-israelense

Dr. Thabet Abu Rass

TEL AVIV – Os dias estão mais do que tensos em Israel e isso não é segredo para ninguém. Desde a minha última coluna aqui neste espaço, a situação piorou bastante em muitas frentes. Confrontos em Jerusalém e na Cisjordânia, milhares de ataques aéreos contra Israel perpetrados por grupos palestinos da Faixa de Gaza, respostas contundentes e violentas do exército israelense contra o Hamas e a Jihad Islâmica, tensão nas fronteiras com Líbano, Síria e Jordânia… Tudo isso acontecendo ao mesmo tempo, quase como um cenário apocalíptico.

Mas o que mais preocupa a maioria dos israelenses são o vandalismo e os confrontos entre árabes e judeus dentro de Israel, em cidades mistas como Lod, Ramle, Akko e Haifa ou em cidades de maioria judaica como Bat Yam. A coexistência pacífica entre a maioria judaica (74% da população) e a minoria árabe (21%), algo complicado e construído a duras penas nos últimos 73 anos, parece estar em perigo. 

Para falar um pouco disso, abaixo compartilho partes de uma entrevista com o Dr. Thabet Abu Rass, diretor-executivo da ONG Abraham Initiatives*, que justamente trabalha por essa convivência. Como parte dessa minoria árabe, o Dr. Abu Rass está preocupado e acha que algo deve ser feito, e logo, para estancar esse momentum de violência para que não se transforme numa guerra civil de verdade.

É importante notar como, para o Dr. Abu Rass, a narrativa é diferente da dos judeus israelenses. Para judeus, os árabes é que começaram com esses confrontos e vandalismo violentos nas cidades mistas. Para os árabes, de acordo com o que diz o Dr. Abu Rass, é o contrário. Esse tipo de dissonância está na raiz do conflito entre árabes e judeus na Terra Santa. Cada lado tem uma narrativa, uma História distinta – em geral oposta.

E daí nascem os temores, as acusações e o ódio que a gente vê nos últimos dias. É importante que os dois lados se ouçam e entendam as motivações do outro. 

Abaixo, partes da entrevista do Dr. Thabet Abu Rass:

“Em Israel, estamos em uma crise profunda e se não fizermos algo para parar a violência pela raiz, vai piorar. Nós, árabes, nos acostumamos a confrontos com a polícia israelense. Mas, desta vez, é uma crise no nível da comunidade. Receio que estejamos perto da balcanização do conflito se não fizermos nada”.

“Qualquer dano a civis inocentes no espaço público, no espaço privado ou propriedade deve ser condenado. Não devemos aceitar nenhum dano aos civis ou ao espaço público.

“O discurso da mídia israelense é unilateral: é sempre palestinos atacando israelenses, árabes atacando judeus e, infelizmente, isso não é verdade. Essa onda de violência realmente começou em cidades mistas, mas na verdade porque um cidadão árabe foi morto por um colono judeu que mora na cidade. Existem causas profundas para a violência: a marginalização, a alienação e discriminação contra residentes árabes é uma causa séria para isso.

“Acredito que tudo começou com o que aconteceu em Jerusalém, no último mês, desde o começo do Ramadã: teve o fechamento do Portão de Damasco, a evacuação de palestinos do bairro Sheikh Jarrah, o uso de violência e gás lacrimogêneo dentro da mesquita de Al-Aqsa. Tudo isso deixou as pessoas frustradas.

“Há uma nova geração de palestinos que se sente humilhada, a geração jovem. Alguns políticos agravaram a situação. (Os parlamentares de extrema-direita Itamar) Ben Gvir e (Betzalel) Smotrich fizeram uma tour em Lod há 2 semanas com a agenda de expulsar os árabes de cidades mistas. Tudo isso contribuiu para este ciclo de violência.

“Devemos fazer algo sobre isso. Eu chamo a todos, todos os políticos, judeus e árabes, para conter a violência agora. A situação é muito perigosa. Estamos aqui para ficar, árabes e judeus. Nós árabes estávamos aqui antes do estabelecimento do Estado de Israel. 

“O resultado da 4ª eleição parlamentar em 2 anos é uma séria divisão, na política israelense. De um lado, o primeiro-ministro (Benjamin) Netanyahu, por outro (Yair) Lapid como o líder do bloco de mudança. Por causa do equilíbrio entre os dois campos, a importância dos votos árabes é muito óbvia. Ambos os líderes estão tentando convencer os árabes a apoiarem seus campos. Acredito que Netanyahu falhou nisso. 

“Há um interesse do ponto de vista árabe em apoiar um governo de Mudança e eles estavam perto de chegar a um acordo com Lapid, para fazer parte da coalizão de governo, na verdade apoiar a coalizão de fora. Nove em cada 10 parlamentares árabes estavam dispostos a apoiar tal governo. Mas talvez as coisas tenham mudado, nos últimos dois ou três dias, por causa da violência. Sem dúvida, essa violência afetou essa negociação, trazendo as questões religiosas nacionais para o primeiro plano. Isso e ruim para a possível parceria política árabe-judaica. 

“Netanyahu gostaria de ver um governo nacional judeu que dependa apenas dos partidos judeus e sionistas, mas espero que Lapid não desista de sua promessa de ter um governo no qual os árabes estejam envolvidos. Os árabes gostariam de ser parceiros, eles têm batido às portas dos partidos políticos israelenses há muitos anos, passando de uma política chorosa para uma política de engajamento. Eles gostariam de ser parte do jogo político.

“Nossa agenda é trabalhar dentro de Israel para tentar manter alguma esperança nas relações entre árabes e judeus. Estamos entrando em contato com os prefeitos, para que façam declarações conjuntas em nível regional, condenando a violência e pedindo diálogo e respeito mútuo. Isso está acontecendo. Estou feliz que tantos prefeitos na Galileia, no Neguev e no Centro de Israel já tenham feito declarações nesse sentido. Espero que dê certo”.

*Entrevista promovida pelo Jerusalem Press Club

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