Israel terá terceira eleição em menos de um ano. Pode, Arnaldo?

A resposta ao título deste texto é: “sim”. É possível. Israel vai às urnas pela terceira vez (!!!) em menos de um ano, algo que nunca aconteceu nos pouco mais de 70 anos da história do país. O Knesset, o Parlamento em Jerusalém, votou nesta quarta-feira (11 de dezembro) por sua própria dissolução menos de três meses depois da votação de 17 de setembro e nove meses depois da votação de 9 de abril. As próximas eleições foram marcadas para 2 de março de 2020.

Cada pleito custa nada menos do que 3 bilhões de shekels (cerca de 3,6 bilhões de reais) aos cofres públicos. Três vezes em um ano é inconcebível. O orçamento do país vai sofrer. Cortes de pessoal, congelamento de projetos. Paralisação na tomada de decisões. Por que essa loucura? A situação é tão inacreditável que o maior jornal do país, o Yedioth Aharonoth (Últimas Notícias) deu como manchete, nesta quinta-feira (12) apenas a palavra “Bushá” (Vergonha, em hebraico).

A resposta é simples e complexa, ao mesmo tempo. Em resumo, após as duas últimas eleições, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, do partido de direita Likud, há 10 anos ininterruptos no poder, não conseguiu costurar uma coalizão de governo com 51% do Knesset (mais de 61 dos 120 parlamentares). O principal rival de Netanyahu, Benny Gantz, do partido centrista Azul e Branco, também não conseguiu, quando teve a oportunidade. O que fazer, então? Novas eleições.

Quem conhece os meandros da política israelense, no entanto, entende que não é assim tão simples. A complexidade vem do fato de que Netanyahu tenta continuar no poder para conseguir imunidade parlamentar em meio a seu indiciamento por corrupção pela promotoria pública. Para isso, ele precisa estar à frente de um governo com mais de 61 parlamentares que aceitem apoiar esse pedido de imunidade. Ele não concebe ir aos tribunais e, quem sabe, ser condenado.

Mas Netanyahu não é o único que aparentemente pensa apenas em sua sobrevivência política mais do que no bem do país. O ex-ministro da Defesa e ex-Chanceler Avigdor Lieberman, líder do partido Israel Beitenu (Israel Nossa Casa), tenta se estabelecer como peça fundamental no xadrez político israelense para, quem sabe em breve, se tornar premiê. Para ele, mais do que formar um governo, ver seus rivais falhando talvez seja mais lucrativo – politicamente falando.

Já Benny Gantz, um ex-comandante das Forças Armadas que se tornou a esperança dos seculares e centristas israelenses, prefere não cogitar uma aliança com Netanyahu ou com Lieberman para não ser taxado de “fraco” e “inexperiente. Melhor novas eleições do que fazer concessões demais ao se unir a um primeiro-ministro sob indiciamento ou a um ex-ministro da Defesa que, apesar de prometer a seus eleitores questões liberais como casamentos mistos e transporte público no shabat, é tido como mão-dura na questão palestina.

 No meio disso tudo, os partidos ultraortodoxos não cogitam abrir mão de suas plataformas tradicionais (promoção de leis religiosas, isenção do alistamento militar para jovens haredim e etc) e os ultra-direitistas se encastelam na ideia de uma Grande Terra de Israel (anexação da Cisjordânia e a promoção de mais assentamentos por lá).

“Os políticos só pensam em seus objetivos pessoais e políticos de longo prazo e ninguém pensa no bem imediato do país”, resumiu a repórter Dafna Liel, do Canal 12.

Dentro do partido governista Likud, a disputa interna por quem será o próximo líder na Era Pós-Netanyahu (que se aproxima a passos largos) se tornou algo público. O principal rival de Netanyahu dentro do próprio partido, Guideon Saar, quebrou a tradição dos likudnikim de veneração cega ao líder. Muitos partidários já declararam abertamente apoio a Saar, algo que há meses parecia impossível.

Como tudo isso começou? A crise política explodiu quando Avigdor Lieberman, que sempre se identificou com o bloco de partidos de direita, deu para trás e deixou esse bloco por discordar dos ultraortodoxos. Lieberman pode ser um gavião em termos de segurança, mas sua base de eleitores é a minoria russa, que almeja a aprovação de leis seculares e liberais. Sem Lieberman, o bloco de direita ficou capengo e sem possibilidade de costurar uma coalizão.

Por outro lado, o bloco de esquerda também não tem maioria. Resultado: há dois grandes blocos (como se fossem grandes uniões partidárias) com 55% da Knesset. E o Lieberman no meio, como fiel da balança.

Falou-se muito da opção de que Likud e Azul e Branco abandonassem seus blocos e formassem, só eles, um governo de “União nacional” – com revezamento de Netanyahu e Gantz como primeiro-ministro (dois anos cada um). Afinal, os dois partidos empataram nas duas eleições, com cerca de 32 a 35 cadeiras cada em abril e setembro. Juntos, teriam mais de 70 das 120 cadeiras do Knesset. Simples, não?

Não. Netanyahu fechou um acordo com os partidos ultraortodoxos e ulta-direitistas. Com isso, afugentou o Azul e Branco e o Israel Nossa Casa na costura de um possível governo de “União Nacional”. Por outro lado, Benny Gantz não quis cogitar uma união com Netanyahu sob indiciamento – principalmente depois que ele exigiu ser o primeiro no revezamento como premiê (por no mínimo seis meses). A última condição de Gantz foi a de que Netanyahu abrisse mão de pedir imunidade.

Ninguém garante que, para as próximas eleições, em março, um dos dois blocos consiga 61 cadeiras: “Os resultados não serão diferentes nas próximas eleições”, disse o analista Amnon Abramovich.

Tudo indica que os eleitores israelenses vão votar mais ou menos como em setembro, mas com certo fortalecimento do Azul e Branco. Segundo pesquisa do Canal 13, o Azul e Branco receberá 37 cadeiras e o Likud 33. Nenhum bloco, novamente, chegaria a 61 cadeiras.

Diante desse quadro, resta pensar que Netanyahu decidiu por novas eleições apenas adiar o inevitável: se defender nos tribunais. Quer continuar a ser o premiê o maior tempo possível, mesmo que interinamente até um novo pleito, na esperança de receber a tão almejada imunidade parlamentar. É só isso que interessa. Já tem gente se preparando para as próximas eleições: a que virá depois da de março.


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