O elefante na sala: A sociedade árabe-israelense e a Revolução Jurídica

Por Revital Poleg

Uma das maiores preocupações que a revolução jurídica está provocando é o recuo esperado  da democracia e o prejuízo dos direitos civis em geral e dos diversos setores e minorias que compõem a sociedade israelense, em particular.

Esta compreensão, que cada vez mais penetra na consciência pública, e a velocidade com que este processo revolucionário está acontecendo, causam um crescimento no escopo do protesto popular, tanto no número de participantes quanto em sua diversidade humana e política.

Nesse cenário, a ausência da sociedade árabe-israelense do protesto, se destaca. Este é, sem dúvida, o “elefante na sala” (ou, pelo menos, um dos elefantes) e o silêncio sobre o assunto é estrondoso. Em outras palavras, reflete claramente que esta é uma questão controversa, mas a preferência é de não tocar no tema. Então, o que está acontecendo lá?

Desde o posse do atual governo de Netanyahu, ao final de dezembro de 2022, o público árabe-israelense está olhando com preocupação aquele governo que inclui elementos de extrema direita nacionalista, que os trata com desconfiança e até hostilidade, e que está liderando uma revolução que pode deteriorar significativamente o delicado relacionamento entre os cidadãos árabes e as instituições estatais e entre judeus e árabes. 

A liderança política árabe-israelense na atual Knesset se encontra em um dos seus pontos mais fracos em anos. O número de seus mandatos se reduziu bastante – agora, são 10 membros e, na eleição anterior, eram 14. Isso apesar de uma maior porcentagem de votação por parte do público árabe nas recentes eleições (53,2%), em comparação com a menor porcentagem de votação jamais realizada (44,6%) nas eleições de 2021.

Esta realidade representa uma profunda contradição do ponto de vista dos cidadãos árabes: por um lado, eles fizeram um verdadeiro esforço para aumentar significativamente sua porcentagem de votos, mas, por outro lado, a presença na Knesset se enfraqueceu muito. O enfraquecimento dos partidos árabes foi, na prática, um dos fatores que mais influenciou o perfil do atual governo e a chegada ao poder do bloco político de extrema-direita, que é visto como um adversário aos olhos da maioria do público árabe. A frustração, na sociedade árabe, portanto, é profunda e se torna ainda mais complexa diante da revolução jurídica.

No início, os líderes dos partidos árabes chamaram seu público a participar nos protestos contra a intenção do governo de implementar reformas profundas no sistema jurídico, e até mesmo participaram das manifestações durante as primeiras semanas. No entanto, eles evitaram tomar medidas práticas para organizar protestos e recrutar cidadãos árabes para participar dos mesmos. Os dirigentes das organizações da sociedade civil árabe agiram de forma semelhante.

Ayman Odeh, membro da Knesset e líder do partido Hadash, fez uma convocação pela escalada da luta contra os planos do governo, e para liderá-la ao nível popular, político, legal, parlamentar e até mesmo internacional. Ele considera o conflito israelense-palestino e a necessidade de terminar a ocupação como parte integrante da luta pela democracia, e está pronto para cooperar com os partidos judaicos de esquerda e centro. Na prática, além da retórica que foi expressa no início do protesto, os parlamentares árabes escolheram baixar a voz e adotar uma estratégia pragmático-utilitária a fim de manter uma chance de cooperação com ambos os lados.

No discurso das redes sociais entre os jovens árabes, há expressões generalizadas de raiva contra os movimentos de protesto judaicos, alguns dos quais tentam excluir os árabes das manifestações por medo de que eles levantem bandeiras palestinas – algo que este governo ameaça proibir em legislação. A ideia de evitar bandeiras palestinas seria não desviar a atenção da própria revolução e do “quadro geral” da luta contra ela, e para permitir a participação de uma ampla gama de opositores do espectro da direita. 

Sob tais circunstâncias, o sentimento de alienação entre os jovens árabes está aumentando: enquanto a direita judaica os vê como “terroristas” ou “apoiadores do terrorismo”, a esquerda quer a presença deles, com a condição de que eles escondem sua identidade nacional palestina, uma condição que não é aceitável nem possível.

A atitude generalizadora e de desconfiança diante dos jovens árabes, se espalha também para o âmbito político, onde existe um crescente medo de ilegalizar os partidos árabes e os membros da Knesset, ao defini-los como “apoiadores do terrorismo”, ameaça que já foi expressada por membros do partido de Ben Gvir.

Além disso, o receio de uma deterioração na segurança por causa de questões sensíveis, como Jerusalém e a Mesquita Al Aqsa, também influi nas relações entre os tomadores de decisões políticas e a sociedade árabe. 

Uma escalada deliberada ou acidental, caso ocorra, poderia levar a distúrbios ou atos de violência por elementos extremistas de ambos os lados, o que também poderia levar à radicalização das decisões políticas.

Os governos de direita e centro-esquerda do passado (incluindo os governos anteriores de Netanyahu) reconheciam e determinavam que a promoção e integração dos árabes na vida social, econômica e política é de suprema importância nacional para a resiliência social, econômica e moral de Israel. Medidas foram tomadas, mas ainda há um longo caminho a percorrer.

O Ramadã, que será celebrado brevemente, em paralelo à Pessach, período que sempre foi considerado sensível e este ano talvez até mais que nunca, é em grande medida uma hora de teste para o governo israelense que esclarecerá para onde nos dirigimos.

O “elefante na sala” está aqui e pode crescer mais ainda. Não podemos e não devemos fazê-lo acontecer.

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