Israel e os EUA: presidente Herzog visita Washington à sombra da reforma legal

Revital Poleg

Na véspera da visita do presidente de Israel, Yitzhak (Bougie) Herzog, aos EUA, parece que o presidente Joe Biden está começando a perder a paciência com o governo israelense – ou, mais precisamente, com o primeiro-ministro. Se Benjamin Netanyahu não agir para parar o círculo vicioso causado por sua reforma, Israel poderá enfrentar ainda mais motivos para preocupação. 

O artigo de Thomas Friedman, o comentarista político sênior do “New York Times” que está bem próximo ao governo Biden, publicado em 12 de julho, é sem precedentes em sua severidade contra as mudanças no sistema judicial israelense. Não só isso, Friedman acrescenta que os EUA já estão “reconsiderando” o relacionamento com Israel. Embora essa afirmação tenha sido rapidamente negada por ambos os lados, tanto por Israel quanto pela Casa Branca, o mero fato de que tal opção é mencionada é nada menos do que um alerta que não pode ser ignorado.  

Quem conhece a administração norte-americana muito bem e entende a mensagem melhor do que muitas outras pessoas é o próprio Netanyahu. Será que isso o fará mudar seu comportamento, suavizar o processo ou interrompê-lo? A essa altura, duvido muito.

Em um anúncio inusitado, emitido pela Casa Branca na última terça-feira, 11 de julho, foi declarado que eles “pedem às autoridades de Israel que protejam e respeitem o direito a manifestações pacíficas e não violentas”. As palavras foram ditas durante o Dia de Interrupção, iniciativa dos opositores da reforma, após a aprovação em primeira leitura do projeto de lei para abolir a cláusula de razoabilidade, votada no dia anterior. 

A reação da polícia contra os manifestantes foi bastante violenta, como nunca antes, com feridos e detidos (e sem nenhum dano a qualquer policial). O porta-voz americano afirmou também que “em Israel, há um debate público significativo sobre o plano do governo acerca do sistema judiciário. Tal debate é saudável e faz parte da democracia vibrante”. Acrescentou que, para esse fim, é necessário que haja “um amplo consenso e base de apoio”.

O artigo de Friedman foi publicado no dia seguinte ao anúncio da Casa Branca e apenas dois dias após a entrevista que o presidente Biden concedeu à CNN, na qual ele disse que “Netanyahu tem alguns dos membros do governo mais extremistas que já vi, e eu volto no tempo até Golda Meir. Smotrich e Ben Gvir são parte do problema na Cisjordânia”.

Desde que Israel foi fundado, as relações com os Estados Unidos são relações íntimas e especiais. Essas ligações foram baseadas, ao longo dos anos, em valores, interesses e ideias comuns  e manifestadas no alto nível de confiança e cooperação. A base sólida sobre a qual o relacionamento foi construído permitiu aos dois países preservá-lo mesmo quando surgiram diferenças de opinião, situação legítima mesmo entre amigos próximos. 

Por trás desses laços existe a compreensão de que as democracias americana e israelense são construídas com base em instituições sólidas, freios e contrapesos e um sistema judicial independente, e que os dois países possuem valores comuns de liberdade, democracia, proteção dos direitos civis e muito mais. 

A cooperação estratégica e de segurança entre os dois países é significativa e profunda, e segue firme da mesma forma ainda hoje, e a assistência americana a Israel é também um reflexo desses laços. Não é de surpreender, portanto, que a reforma legal liderada pelo governo de Israel e a composição extrema do governo de Netanyahu criem uma preocupação crescente na administração e grande falta de clareza sobre a questão: para onde Israel está indo?

Biden e Netanyahu têm uma longa amizade, que remonta à época que Netanyahu atuou como ministro na embaixada de Israel em Washington, nos anos 80, enquanto Biden foi um dos senadores mais pró-Israel nos Estados Unidos. Nos anos seguintes, a simpatia de Biden por Israel permaneceu firme, e suas visitas a Israel foram frequentes. O vínculo entre os dois teve muitos altos e baixos, mas a longa amizade e o apreço mútuo, apesar da diferença de opiniões, permaneceram intactos. 

Com o retorno de Netanyahu ao atual posto de primeiro-ministro, parecia que a relação com Biden se deteriorou a um nível recorde. A decepção que Biden experimenta hoje, por causa do governo de Netanyahu, também inclui um desapontamento pessoal da pessoa que ele aprecia, respeita e valoriza há muitos anos.

Um dos principais motivos pelo qual os Estados Unidos acompanham de perto o que está acontecendo atualmente em Israel é que a Suprema Corte é a instituição judiciária que se ocupa com as atividades do governo na Cisjordânia e também fornece assistência jurídica aos palestinos.

A administração americana costuma defender Israel em fóruns internacionais e alega regularmente que o sistema judiciário israelense é forte e independente e, portanto, não há necessidade de investigar Israel em tribunais internacionais. No entanto, ao prejudicar a independência do sistema judiciário, será difícil para os americanos manter sua posição de defender Israel nesses fóruns – o que poderia levar à abertura de investigações contra soldados e oficiais no contexto das ações do exército.

Esse de fato é um dos principais motivos para o protesto dos militares da reserva – pilotos, tecnólogos, pessoal de unidades especiais de combate, etc. – que temem a legitimidade das decisões militares que um governo antidemocrático pode tomar e que eles serão obrigados a executar, o que posteriormente pode expô-los a processos e investigações na Corte Internacional da Justiça.

As reações da Casa Branca e de altos funcionários do governo contra a reforma legal se tornam mais e mais frequentes, as expressões de Biden na entrevista que concedeu à CNN, o não convite a Netanyahu para visitar Washington, as insinuações sobre o adiamento do processo de normalização das relações com a Arábia Saudita, a profunda preocupação quanto à conduta dos colonos na Cisjordânia, que é feita com o apoio e o incentivo de ministros do governo, o artigo de Thomas Friedman, que causou um grande eco em Israel, tudo isso e muito mais levou vários ministros a se expressarem de maneira brusca e desdenhosa (e, acima de tudo, com total falta de conhecimento) em relação aos EUA, o que não é nada além do que ultrajante, vergonhoso e também triste.

A administração americana, liderada pelo Presidente Biden, tem muito cuidado em separar o relacionamento com Netanyahu e seu governo extremista, por um lado, e o Estado de Israel, por outro. 

O presidente Herzog chegará aos Estados Unidos dentro de poucos dias. Ele vai se reunir com o Presidente Biden e outros altos funcionários e, em 19 de julho, vai falar às duas câmaras do Congresso. Em seu artigo, Thomas Friedman escreve que: “A reunião com Herzog é a maneira de Biden sinalizar que o problema dele não é com o povo israelense, mas com o governo extremista de Netanyahu”. Friedman também acrescenta que: “Não tenho dúvidas de que o presidente dos EUA fornecerá ao presidente israelense uma mensagem – de tristeza, e não de raiva”.

Foto: Reprodução/Wikicommons

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