Ramadã 2024: O temor de mais violência durante o mês sagrado

Daniela Kresch

TEL AVIV – O Ramadã de 2024 se aproxima. Deve começar entre 11 e 12 de março e terminar em 9 de abril, dependendo do local. E, como sempre, há um temor em Israel pelo que pode acontecer neste mês. O Ramadã é, a rigor, um mês sagrado para os muçulmanos, marcado pelo jejum durante o dia, muita oração, reflexão e caridade. É um mês de festejos e ceias noturnas com parentes e amigos. Mas, nesta região, se tornou, infelizmente, sinônimo de violência e de atentados terroristas contra israelenses.

A cada ano, o nível das tensões entre palestinos e israelenses aumenta durante o Ramadã. Isso porque, para alguns muçulmanos extremistas, o Ramadã é o momento de demonstrar lealdade a Alá atentando contra a vida de “infiéis” (não-muçulmanos). Por aqui, isso significa matar judeus.

Às vésperas do Ramadã de 2021, por exemplo, o detestável líder do Hamas em Gaza, Yahiya Sinwar, fez um discurso conclamando todos os palestinos (incluindo os árabes cidadãos de Israel) a atacarem israelenses em toda a “Palestina”: de Beer-Sheva à Galileia, passando por Lod e Haifa (todas áreas e cidades internacionalmente reconhecidas como partes legítimas de Estado de Israel).

Aliás, a miniguerra de 11 dias entre Israel e o Hamas em 2021 teve a ver com o Ramadã. Tudo começou depois que a polícia israelense, em meio a preocupações de segurança, fechou a praça em frente a um dos portões da Cidade Velha de Jerusalém, no início do Ramadã. As tensões aumentaram ainda mais devido aos relatos do possível despejo de famílias árabes de casas no bairro de Sheikh Jarrach, em Jerusalém (o despejo nunca ocorreu). Em pouco tempo, o grupo terrorista Hamas, apoiado pelo Irã, começou a disparar foguetes a partir de Gaza.

Em 2022 e 2023, houve menos incidentes, mas ainda sim houve atentados e tentativas de atentados. A pergunta é: o que acontecerá este ano? A guerra em Gaza, a crise econômica na Cisjordânia, a escalada da violência do Hezbollah na fronteira Norte de Israel, a incitação do Irã para que palestinos da Cisjordânia, árabes-israelenses, libaneses do Hezbollah e iemenitas Houthis ataquem judeus… Tudo isso pode levar a uma onda de atentados terroristas como nunca vista em Israel durante o Ramadã.

Outro fator que pode minar os esforços para conter um Ramadã violento é o infame ministro da Segurança Nacional, o ultranacionalista Itamar Ben Gvir. Ele declarou que gostaria de proibir árabes-israelenses de rezar na Esplanada das Mesquitas, foco de peregrinação durante o Ramadã durante todo o mês sagrado. Isso levaria certamente a uma onda de protestos em Jerusalém Oriental que ecoaria por todo o mundo muçulmano. Por agora, ao que parece, o premiê Benjamin Netanyahu não deu aval para esse plano incendiário de Ben Gvir.

Na verdade, ao que tudo indica, será o atual gabinete de guerra, que toma decisões na atual guerra contra o Hamas, o responsável por essa questão. O gabinete é composto por Netanyahu, pelo ministro da Defesa Yoav Gallant e pelo ministro Benny Gantz, além de outros membros que atuam como observadores. Isso afasta Ben Gvir da tomada de decisões (ele não faz parte do gabinete de guerra). O gabinete deve limitar a entrada de fiéis na Esplanada por idade – que acontece há anos – para evitar confrontos.

Mas, ainda assim, as perspectivas não são nada boas. Às vésperas do começo do Ramadã, o número de atentados e tentativas de atentados contra israelenses já se elevou. Desde o começo do ano, o Shin Bet (Serviço de Segurança) evitou mais de 150 atentados contra israelenses em Israel e na Cisjordânia. Os números só aumentam à medida em que o Ramadã se aproxima.

Na verdade, não precisa muito para a situação explodir no Ramadã. O motivo principal é uma “fake news” que ganha cada vez mais força no mundo árabe-muçulmano. A teoria conspiratória acredita que Israel tem intenção de destruir a Mesquita de Al-Aqsa para construir um Terceiro Templo judaico no lugar.

Não digo que não haja israelenses que sonhem com um Terceiro Templo. Tem até uma ONG chamada “The Temple Institute” que se dedica a organizar como seria esse novo templo, que roupas os sacerdotes vestiriam, que incensos seriam acesos, etc. Mas é esdrúxulo na cabeça da grande maioria dos israelenses – principalmente a maioria secular do país – e, mais importante ainda, não é e nunca foi um objetivo ou uma política oficial de qualquer governo nos 75 anos do país.

Isso não impede que os palestinos se estressem com a fake news espalhada deliberadamente pelo eixo Irã-Hamas-Hezbollah, com aquiescência do Catar através da Al Jazeera (não faltam reportagens desse canal aludindo a um suposto plano israelense de destruir a Mesquita de Al-Aqsa).

Afinal, todos sabem que basta uma faísca no Monte do Templo/Esplanada das Mesquitas (o mesmo local tem dois nomes, um judaico e um árabe) para o Oriente Médio entrar em combustão. Esse lugar de meio quilômetro quadrado, que fica na Cidade Velha de Jerusalém, é reverenciado pelos judeus porque foi lá que, pelo relato bíblico, Abraão quase sacrificou Isaac e foram erguidos o Primeiro e o Segundo Templos judaicos, das épocas de Salomão e de Herodes, respectivamente. Os templos seriam a morada de Deus na Terra. O atual Muro das Lamentações é uma das muralhas que envolviam o Segundo Templo, destruído em 70 da Era Comum pelo exército romano.

Ao mesmo tempo, a Esplanada das Mesquitas/Monte do Templo o mesmíssimo local é onde, segundo a tradição islâmica, Abraão quase sacrificou Ismael (não Isaac) e onde foram erguidas – após a destruição do Segundo Templo – o Domo da Rocha e a Mesquita de Al-Aqsa, o terceiro local mais sagrados do Islã após Meca e Medina, de onde o Profeta Maomé teria subido aos céus em seu cavalo.

Esse pequeno quadrilátero é o coração do conflito entre árabes e judeus no Oriente Médio. A base religiosa da adoração a esse lugar se tornou o principal símbolo nacional tanto para israelenses quanto para palestinos. Muitos judeus não-israelenses também dão ao Muro das Lamentações e ao Monte do Templo uma importância ímpar. Assim como todo o mundo árabe-muçulmano, não só os palestinos.

Tem gente que não se importa em matar ou morrer por esse pequeno pedaço de terra. Principalmente agora, no meio de uma guerra de enormes proporções que está sob os holofotes do mundo.

Este texto não reflete necessariamente a visão do Instituto Brasil-Israel.

Foto: GPO

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