Um racha no voto Árabe: Será o que Netanhyahu esperava para voltar ao poder?

Daniela Kresch

TEL AVIV – Um mês e meio antes das eleições em Israel – o 5º pleito desde abril de 2019 -, o drama político no país não dá trégua. No dia 15 de setembro, exatos 45 antes das eleições de 1° de novembro, todos os partidos que almejam cadeiras no Knesset (o Parlamento em Jerusalém) tiveram que submeter ao Comitê Central de Eleições (o TSE daqui) as listas completas dos nomes de seus candidatos.

Se alguém pensava que seriam procedimentos apenas burocráticos, errou. Menos de uma hora antes do prazo final para a apresentação dos nomes, uma surpresa: a Lista Conjunta (a maior coligação de maioria árabe de Israel, com três partidos) rachou em duas.

Antes, a Lista Conjunta era uma união de três partidos: o socialista-comunista Hadash, liderado pelo parlamentar Ayman Odeh; o árabe-nacionalista Balad, liderado pelo pelo parlamentar Sami Abou Shahadeh; e Ta’al, liderado pelo parlamentar Ahmad Tibi, que, ideologicamente, está em algum lugar entre os outros dois. Com o racha, o Balad deixa a Lista Conjunta. Fora isso, o partido Ra’am, de Mansour Abbas, que também fazia parte da Lista Conjunta até 2021, decidiu continuar a concorrer sozinho.

Mas o que isso significa? Qual é o problema de um partido anunciar um racha como esse? Na política israelense, é quase como um terremoto. Afinal, se a união faz a força, uma desunião como essa pode enfraquecer não só a representação dos árabes do país no Knesset como todo o bloco de esquerda, ou, melhor dizendo, o bloco anti-Benjamin Netanyahu.

A evaporação da Lista Conjunta significa uma divisão ainda maior dos votos da minoria árabe de Israel (21% da população). E o problema disso é que, caso um desses três partidos – a Hadash-Ta’al, o Balad e o Ra’am – não consiga o mínimo de votos válidos necessário para eleger parlamentares, ou seja, 3,25%, simplesmente desaparecerá do Knesset. E isso significa que o bloco dos partidos de direita – ou pró-Netanyahu – se fortalecerá.

Ainda não quer dizer que Netanyahu conseguirá o número de cadeiras necessárias para formar o próximo governo e fazer seu tão desejado comeback político. Segundo as pesquisas eleitorais divulgadas depois do racha da Lista Conjunta, nenhum dos blocos contabiliza o número mágico de 61 cadeiras (51% dos 120 assentos do Knesset). Mas Netanyahu certamente está mais otimista.

Nas duas pesquisas, o bloco pró-Netanyahu chega a 60 cadeiras, enquanto o do bloco anti-Bibi, 56. Ainda não é maioria, mas Netanyahu, líder do partido de direita (cada vez mais de direita) Likud, já pode sonhar com o governo estreito, talvez até sem maioria clara, mas que o leve de volta ao assento do primeiro-ministro.

A pesquisa do Canal 12 mostrou que o Likud continua liderando com 33 assentos, seguido pelo partido Há Futuro (Yesh Atid), do primeiro-ministro Yair Lapid, com 23 assentos. Depois deles, vem o partido Unidade Nacional (ou, na tradução livre do hebraico, o “Campo Nacional”), do ministro da Defesa Benny Gantz e do ministro da Justiça, Guideon Saar.

Fechando a lista dos que recebem mais de 10 cadeiras, vem a grande surpresa dessas eleições: o partido Religioso-Sionista, parlamentares de extrema-direita – alguns dizem fascistas – Bezalel Smotrich e Itamar Ben Gvir, com 12 assentos. Péssima notícia para a democracia israelense, aliás.

No segundo bloco de partidos, estão os religiosos Shas (8 assentos) e Judaísmo Unido da Torá (7), seguidos do Israel Nossa Casa, de Avigdor Lieberman, com 6. O histórico Partido Trabalhista fica com só 6 cadeiras, enquanto o tradicional esquerdista Meretz, com 5.

E, perigando não conseguir o número mínimo de votos estão o Ra’am e a coligação Hadash-Ta’al – dois dos três representantes da voz árabe. O Balad, que decidiu sair da Lista Conjunta, só recebeu 0,9% das intenções de votos. Quer dizer: deve ficar de fora do Knesset.

Outro partido que não passa do número mínimo, segundo as pesquisas, é o da ex-ministra da Defesa Ayelet Shaked, ex-braço direito do ex-premiê Naftali Bennett. A Casa Judaica, partido de Shaked e Bennett (que está dando um tempo da vida pública), só recebeu 1,9% das intenções de voto. Lembrando: só entra no Knesset quem consegue, no mínimo, 3,25% dos votos.

Em suma, a dramática divisão, na última hora, da Lista Conjunta, pode acabar sendo uma das ocorrências mais importantes da eleição. Para muitos especialistas, o efeito-cascata desse passo pode empurrar o bloco pró-Netanyahu para os 61 assentos, já que muitos votos da minoria árabe (principalmente dos eleitores do Balad) simplesmente devem ir para o lixo.

Para outros especialistas, no entanto, a saída do Balad da Lista Conjunta pode causar o efeito contrário. Muitos árabes-israelenses que pensavam em nem ir votar em 1° de novembro, podem decidir comparecer às urnas e votar na coligação Hadash-Ta’al. Isso porque o Balad é rejeitado por muitos árabes de Israel que almejam uma maior integração na sociedade israelense e não gostam da plataforma do Balad de não-integração a Israel.

O racha com o Hadash-Ta’al ocorreu justamente porque o Balad foi o único grupo dos três que insistiu em prometer antecipadamente que não recomendaria nenhum candidato a primeiro-ministro ou cooperaria com qualquer coalizão após a eleição. Nem Ayman Odeh, de Hadash, nem Ahmad Tibi, do Ta’al, descartam essas opções.

Pelo contrário, os dois disseram, depois de apresentar sua lista na noite de quinta-feira, que consideraram cooperar com o primeiro-ministro Yair Lapid sob “as condições certas” e que sua tarefa era “ganhar a confiança do público árabe e dos judeus que apoiam democracia”, bem como “fazer de tudo para que o público vote e bloqueie a extrema-direita”. Afinal, o Ra’am, de Mansour Abbas, colaborou com o governo de Bennett e Lapid, se tornando o primeiro partido árabe a fazer isso desde a criação de Israel, em 1948. Então, já há um precedente.

Por isso, o novo cenário pode, no final das contas, acabar beneficiando o atual premiê Yair Lapid e o bloco anti-Bibi como um todo. Isso se um maior número de eleitores árabes for realmente às urnas.

Em suma, a 45 dias das eleições em Israel, tudo parece ainda estar em aberto. A política israelense ainda guarda muitas surpresas na manga.

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