A ameaça Houthi contra Israel: perigo global incentivado pelo Irã

Revital Poleg

À luz do veto norte-americano à proposta de resolução do Conselho de Segurança da ONU, da última sexta-feira, 8 de dezembro, que exigia o cessar imediato dos ataques israelenses em Gaza, os rebeldes Houthi no Iêmen ameaçaram que todo navio que navegue rumo a Israel pelo Mar Vermelho, mesmo que não seja israelense, será um alvo legítimo para seu ataque. 

De acordo com o grupo, essa ameaça será mantida enquanto Israel não permitir a transferência de ajuda humanitária para a Faixa de Gaza. Isso é nada menos do que uma ameaça estratégica às rotas marítimas internacionais ou, em outras palavras, à cadeia de suprimentos global, que é o tubo de oxigênio econômico para as commodities do mundo. Acima de tudo, trata-se de uma ameaça que pode deteriorar em um conflito militar internacional no Mar Vermelho.

Quando, há poucas semanas, os houthis lançaram pela primeira vez um míssil balístico e um veículo aéreo não tripulado (VANT) na direção de Eilat, a cidade mais meridional de Israel, localizada na costa do Mar Vermelho, no dia 19 de outubro, muitos em Israel correram para verificar na Wikipédia quem eram eles. Até aquele evento, os Houthis eram, em termos do público israelense, um fator pouco conhecido e certamente não eram vistos como nossos inimigos tangíveis.

Após esse evento, os Houthis lançaram vários mísseis e VANTS contra Israel (todos os quais foram interceptados com sucesso) e também realizaram uma série de tentativas de tomar controle de navios considerados de propriedade israelense, navegando nas águas do Mar Vermelho. Uma dessas tentativas foi até coroada com sucesso (a captura do navio Galaxy Leader), mas vale destacar que o proprietário desse navio não é israelense e que não havia nenhum cidadão israelense a bordo.

Quem são os Houthis e por que eles ameaçam Israel? Trata-se de uma organização terrorista muçulmana xiita-zaidita muito violenta, operando no noroeste do Iêmen e na Península Arábica. Eles são de uma tribo originária do noroeste do Iêmen, à qual estima-se que 30% da população do país pertence. Após a unificação entre o Norte e o Sul do Iêmen (1990), os Houthis conseguiram tomar o controle da capital, Sana’a. Essa guerra civil continua até hoje. A organização é financiada pelo Irã, fazendo parte do eixo de resistência que inclui Irã, Síria, Hezbollah, Hamas e várias outras milícias. Trata-se de uma aliança político-militar que se opõe ao Sunismo, considerando-o inimigo do Islã. Portanto, é predominantemente anti-americana, anti-sionista e anti-Arábia Saudita.

O Irã tende a utilizar seus “proxies” e evitar “sujar as mãos” em tarefas que outros podem realizar em seu lugar, como ocorre no caso dos Houthis. Os iranianos oferecem aos Houthis treinamento, expertise técnica e armamentos sofisticados, incluindo drones e mísseis balísticos, como os já lançados pelos Houthis em direção a Israel. A atividade terrorista marítima dos Houthis que ameaça as rotas de navegação internacionais é também conduzida sob a direção, aprovação e incentivo iranianos, com a intenção de transformar o conflito atual em algo global.

A ameaça às rotas de navegação e do terrorismo marítimo não é nova. Já há vários anos, o Irã começou a ameaçar essas  linhas, como fez no Estreito de Ormuz, que fica ao norte, incluindo várias tentativas fracassadas de pirataria. A ousadia dos Houthis tampouco é nova, só que até agora isso não havia sido direcionado a Israel, mas principalmente contra entidades árabes, tais como o Egito e a Arábia Saudita. Os Houthis também transferiram frequentemente armamentos para Gaza, com destino ao Hamas.

Os EUA já confrontaram as naves Houthis várias vezes, tentando deter o perigo, mas a ameaça à liberdade de navegação internacional só está crescendo. A comunidade internacional tem motivos de sobra para ficar preocupada com isso. Diferentemente de outros desafios com os quais Israel está lidando diretamente, como parte da atual guerra em Gaza, e sem desvalorizar as implicações da ameaça costeira sobre a navegação israelense, essa questão constitui, antes de tudo, um problema global. Não foi à toa que os EUA se apressaram em enviar seu maior porta-aviões para a costa mediterrânea de Israel logo após o ataque do Hamas. Isso soma-se à presença americana que já existia no Mar Vermelho. Ademais, o tráfico marítimo é também um componente significativo dos Acordos de Abraão e, portanto, a prevenção de prejuízos à liberdade de navegação é também do interesse direto dos países signatários dos acordos e de outros que pretendem se juntar a eles no futuro. 

A ameaça Houthi atual de prejudicar a segurança marítima de Israel encontra um contexto bem complexo que envolve diversos fatores: Navios são uma “empresa econômica” sofisticada, que inclui seus proprietários, a empresa que o opera, as empresas que aluga seus serviços, a bandeira que eles arvora e a tripulação que o serve, formada por pessoas de diferentes nacionalidades. O contexto israelense nesse sentido, é, então, relativamente baixo em comparação com o quadro geral. Não há dúvida de que os Houthis e, mais além, os Iranianos, estão conscientes disso e estão fazendo um jogo perigoso que, por definição, prejudica os interesses internacionais acima de tudo. Israel em sua guerra contra o Hamas pode ser a “desculpa imediata”, mas por trás disso há uma doutrina iraniana consciente e planejada que tem como objetivo principal os EUA, a Arábia Saudita e o mundo livre em geral.

Contra a ameaça expressada pelos Houthis, já está em formação uma coalizão de países que podem ser prejudicados por esse terrorismo marítimo, incluindo Inglaterra, França e EUA à frente. É bem provável que Israel tenha interesse em fazer parte de tal aliança. Essa ameaça pode colocar o Mar Vermelho no centro de um confronto militar em grande escala. Pode até exigir uma demonstração de força significativa que não poderá aguardar até o estabelecimento da coalizão naval internacional que os EUA estão trabalhando para formar. A reação contra a ação Houthi servirá como caso de estudo internacional não somente no Mar Vermelho, mas também diante ameaças que o Irã manifestou por diversas vezes de prejudicar a navegação no Golfo Pérsico.

Os países da região, principalmente o Egito e a Arábia Saudita, que estão localizados na costa do Mar Vermelho, recebem aqui uma “lição extra” do quanto são vulneráveis às organizações terroristas e ao Irã, como país que os influencia. A ameaça Houthi, embora explicitamente dirigida contra Israel, é, antes de tudo, uma ameaça tangível e imediata para eles. Para relembrar, o Egito já bloqueou duas vezes o portão de entrada para o Golfo de Eilat – o Estreito de Tiran, o que levou ao início das guerras com Israel: A Guerra de Suez (1956) e a Guerra dos Seis Dias (1967). Atualmente, enquanto os rebeldes Houthi do Iêmen anunciaram um bloqueio bem mais significativo do Estreito de Bab al-Mandab, isso pode se tornar, se piorar, uma ameaça de guerra global, na qual Israel não será a vítima principal.

De modo quase paradoxo, a China, que está bem próxima com o Irã, se encontra em um conflito de interesses diante da ameaça ao tráfego marítimo no Estreito de Bab al Mandab e no Mar Vermelho. Esse perigo representa uma ameaça direta ao tráfego marítimo chinês, que é o maior do mundo, e certamente eles não estão interessados em uma ameaça à sua economia que “machuque seu bolso”. Será interessante ver como irão agir nesse contexto.

Por outro lado, a tentativa dos Houthis de danificar o território soberano israelense ao lançar mísseis e drones afeta diretamente Israel. Embora seja uma ameaça relativamente limitada devido à distância, não deve ser subestimada. Não há dúvida de que Israel não ficará inerte diante da ameaça dos Houthis ao seu território, e diante da violação de sua soberania e interesses. O que Israel pode fazer? Israel tem várias maneiras de lidar com a situação e escolherá a mais apropriada de acordo com as circunstâncias e necessidades.

Foto: FeltonDavis/Flickr

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