Carta aberta ao Presidente Lula de uma cidadã israelense

Estimado Sr. Presidente,

Com profunda preocupação, repudio e tristeza, escrevo esta carta aberta a você, diante de suas recentes declarações que compararam a legítima defesa de Israel contra o Hamas, em resposta ao brutal ataque terrorista de 7 de outubro, aos atos monstruosos e à política de extermínio organizado de assassinato em massa pelo regime nazista. Esta comparação não é apenas ofensiva, mas perigosamente distorcida.

Como judia, israelense e sionista orgulhosa, filha de um dos pioneiros que fundaram Israel após escapar dos nazistas e concretizar seu sonho de estabelecer um Estado judeu livre e democrático, vejo suas palavras como um ataque pessoal a mim, ao meu pai (z”l) e a milhões de judeus ao redor do mundo, incluindo, é claro, aqueles no Brasil. A comparação arrepiante que você fez entre a guerra de defesa que Israel foi obrigado a travar e as terríveis ações de Hitler é totalmente inapropriada. Para muitos no povo judeu, especialmente aqueles que sobreviveram ao Holocausto, não foi apenas um episódio da história, mas uma experiência de vida gravada em seus corpos e almas para sempre. Para muitos, a comparação que você fez não é apenas distante da verdade, mas também repugnante.

Como diplomata que representou Israel em diversas missões internacionais, tive a honra de participar dos esforços para promover a paz entre israelenses e palestinos, no âmbito do processo de Oslo liderado pelo então Ministro das Relações Exteriores, Shimon Peres. Acreditei nesse processo naquela época e continuo acreditando na solução de dois Estados para dois povos, apesar do ataque do Hamas, que é, sem dúvida, o mais horripilante desde o Holocausto. Como ex-chefe da delegação da Agência Judaica no Brasil, tive também o privilégio de conhecer e apreciar, além da querida comunidade judaica, o encantador povo brasileiro, sua fascinante diversidade e espírito de tolerância e moderação, qualidades que frequentemente se refletem na política externa de seu país.

Infelizmente, Senhor Presidente Lula, à luz de suas recentes declarações, temo que você tenha perdido a legitimidade para atuar como um exemplo de moderação e servir como um “mediador imparcial” na arena internacional. Você, infelizmente, privou-se dessa possibilidade.

É perfeitamente aceitável que você expresse críticas às ações do governo de Israel; isso faz parte das dinâmicas e “regras do jogo” das relações internacionais e pode ocorrer mesmo entre os aliados mais próximos. Contudo, a maneira como você procedeu não seguiu esses princípios. Suas declarações não afetaram apenas o governo israelense, mas ofenderam todo o povo judeu, contribuindo ainda mais para alimentar o antissemitismo, em vez de combatê-lo.

Alguns podem sugerir que suas comparações resultam de um desconhecimento sobre o Holocausto. No entanto, senhor Presidente, dou-lhe mais crédito do que isso e acredito que você esteja bem informado sobre o assunto. Ademais, sua visita ao Museu Yad Vashem, onde você testemunhou com seus próprios olhos a magnitude da tragédia, torna suas palavras ainda mais problemáticas.

Os nazistas, para lembrar, tinham uma ideologia racista e política declarada e bem ordenada para a extermínio do povo judeu com que os acabou levando à implementação da “Solução Final”. Estarão a comparar isto com a guerra justa de Israel, que enquanto luta contra o Hamas entrega diariamente ajuda humanitária aos residentes da faixa de Gaza – com água, alimentos, medicamentos e combustível, ajuda que o próprio Hamas os impede de receber e o rouba para si mesmo? Será que a comparação que você fez é apropriada ou certa? De jeito nenhum.

Não tenho dúvidas de que o sofrimento da mãe palestina pela perda de seu filho ou filha é tão profundo quanto o da mãe judia. O sofrimento humano é universal, ele não tem cor, raça ou religião, e guerra é sempre uma tragédia, independentemente das circunstâncias. Espero sinceramente que esta guerra termine em breve e possa levar a uma solução política duradoura. Contudo, o Hamas, que tem como objetivo declarado a destruição de Israel, não pode ser parte dessa solução. Ele é, de fato, o problema que enfrentamos todos – inclusive o Brasil, Senhor Presidente, assim como todo o mundo livre.

Senhor Presidente, Espero que esta carta aberta possa servir como uma oportunidade para repensar. Como uma israelense, judia e sionista que também ama profundamente o Brasil e seu maravilhoso povo, convido você a considerar estes pontos e, talvez, encontrar uma maneira apropriada de corrigir esta distorção ofensiva e claramente injustificada.

Atenciosamente,

Revital Poleg

Este texto não reflete necessariamente a visão do Instituto Brasil-Israel.

Foto: Flickr/PaláciodoPlanalto

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